But I still haven't found what I'm looking for


Ele girou a maçaneta, entrou no quarto escuro e deitou-se na cama. Eram por demais exagerados os pensamentos em sua cabeça. A verdade é: não conseguia nem se concentrar no que pensava, não lembrava do assunto há poucos instantes refletido, antes de ser mudado em uma pausa dramática na ópera trágica que passava-se em sua mente. Ligou a vitrola dada anos antes pelo avô - ah, seu Antônio havia guardado e conservado tão cuidadosa e carinhosamente; aquele era o presente do qual mais gostava o rapaz.
Tocava um dos discos mais antigos que tinha: nem do nome da cantora ele conseguia lembrar-se, mas a voz ecoou dentro de seus conturbados pensamentos e o acalmou. Tocou-a durante uns instantes, muitos instantes, instantes demais. Adormeceu. Quando acordou, resolveu continuar a escutar música e pôs um disco do U2. Antigo, também com uma música tantas vezes regravada.
Buscou em sua memória as aulas do curso de inglês pago por seu pai. O vocalista cantava algo que dizia: "But I still haven't found what I'm looking for". Conseguiu traduzir a sentença pra uma realidade que, mesmo após o término da música, permaneceu em sua cabeça: "mas eu ainda não encontrei o que estou procurando".
Era isso, devia ser, o que estava causando tanta agitação nos pensamentos do rapaz a ponto de não conseguir organizá-los. Existia uma incompletude, uma sensação de abandono, de solidão, a qual, para uma mente desavisada, podia se camuflar e confundir como carência. Deve-se, neste ponto, atentar, porém, que não era. Era, de fato, um abandono, uma solidão, mas não dessas facilmente imaginadas; não era física, não se resolvia em encontros... era da alma.
Mas, voltando ao questionamento principal, o que ele estava buscando? E como, poderia ele encontrar se nem sabia o que desejava?
Na verdade, ele estava procurando nada. Não era de seu interesse fazer esse jogo de busca através de um tempo não pertencente a ele. O rapaz deveria empreender seus momentos em achados casuais.
Recolocou o antigo disco da cantora desconhecida na vitrola e ligou a televisão para dublar as palavras do jornalista enquanto escutava a música. Decidiu parar de se preocupar com aquilo que havia gasto tanto de seu tempo naquele dia. Pararia de beber, arranjaria um emprego e, às vezes, dançaria um tango argentino. Quem sabe a alma dele não se deparava inusitadamente com o que solucionaria a sensação?

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